segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Por que Serra perdeu a eleição?

*Opinião do jornalista Kennedy Alencar da Folha de São Paulo e Redetv!


Apesar de alguns erros derivados de certa soberba e de percalços sobre os quais não teve controle, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva executou com sucesso uma estratégia que traçou no começo do segundo mandato: eleger Dilma Rousseff como sucessora.
Foram eixos da estratégia não cair na tentação do terceiro mandato e apostar num plebiscito sobre os seus oito anos de governo contra os oito anos de Fernando Henrique Cardoso.
Enquanto a oposição e parte da imprensa acreditavam que Lula queria o terceiro mandato e fazia jogo de cena para esperar o melhor momento de mudar a Constituição, Dilma Rousseff ficou livre para aparecer nas vitrines positivas do governo. Se ela tivesse sido apontada candidata lá atrás, auxiliares como Erenice Guerra teriam entrado bem antes na alça de mira.
No entanto, dando o devido crédito ao chefe, Dilma ficou livre para ter o controle de todas as bandeiras positivas do governo, como conduzir a mudança da lei para explorar o pré-sal, gerenciar o programa de habitação "Minha Casa, Minha Vida" e virar a "mãe" do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
No teste de fogo da crise internacional de 2008/2009, Lula foi aprovado. Esse teste foi bem mais duro do que o rigoroso ajuste fiscal e monetário de 2003. A oposição cobrava de Lula capacidade de gerenciar a crise. E ele foi bem. Fez um rápido e certeiro diagnóstico da crise financeira internacional e de como o Brasil deveria enfrentá-la. O maior acerto: medidas para reforçar o mercado interno como forma de atravessar o deserto e compensar a queda da economia global.
Nessa estratégia vitoriosa, é justo registrar a importância da aliança PT-PMDB. Na crise do Senado, em 2009, a oposição tentou criar um racha na relação entre peemedebistas e petistas. A ideia era transformar o Senado, Casa na qual Lula sempre teve dificuldade, num bunker oposicionista. Mas Lula não jogou ao mar o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Em troca, obteve uma aliança formal com todo o PMDB, o que garantiu uma máquina política ainda mais expressiva no país e um tempo de propaganda no horário eleitoral gratuito para vender Dilma na hora decisiva.
O bom momento econômico favoreceu a tese de polarização PT-PSDB, apesar do susto com o desempenho de Marina Silva (PV-AC), que forçou a realização do segundo turno. Uma taxa de crescimento de cerca de 7% neste ano fortaleceu a defesa do continuísmo, dando gás a uma candidata tirada do bolso do colete. No contexto econômico, destacaram-se ainda as políticas de reajuste do mínimo, de ampliação do crédito, de massificação de programas sociais e de incentivo a grandes grupos nacionais considerados estratégicos e amigos.
Os principais erros da campanha não comprometeram o resultado final, mas trouxeram muita tensão ao governo na virada do primeiro para o segundo turno. A campanha de marketing de Dilma demorou a perceber a sangria de votos com o debate sobre a legalização do aborto. Gente da cúpula dava como favas contadas uma vitória no primeiro turno quando já era evidente que uma segunda etapa seria inevitável. O próprio Lula se iludiu com sua alta taxa de popularidade. Entre os percalços sobre os quais não teve controle, o principal foi a doença de Dilma em 2009.
Obtida a vitória, há também uma importante lição: a realização do segundo turno e o percentual de votos dados a Dilma não autorizam uma atitude arrogante em relação aos adversários e à imprensa, mas isso será assunto de outra coluna.
*
Ninguém ganha sozinho
Num cenário de extrema adversidade política, é surpreendente a performance de José Serra. Ele disputou a eleição contra a candidata do presidente mais popular da história recente num contexto de crescimento econômico e de transformações sociais inéditas no país. Nesse sentido, é uma derrota que não envergonha o PSDB, mas o candidato cometeu o principal erro de quem deseja conquistar a Presidência: achar que poderia se eleger sozinho.

Nenhum comentário:

Postar um comentário