domingo, 22 de agosto de 2010

Pequena Miss Sunshine




Little Miss Sunshine (Pequena Miss Sunshine ) ou Uma Família à Beira de um Ataque de Nervos (título em Portugal)) é um filme de drama - estado-unidense dirigida por Jonathan Dayton e Valerie Faris lançada em 2006. Conta uma história de uma família que percorre o caminho de Novo México até a Califórnia em uma Kombi amarela, para levar a caçula para um concurso de beleza: "A pequena Miss Sunshine".

Sinopse

Diante de uma situação familiar pouco estável, com cada membro da família com suas peculiares diferenças e problemas, surge a notícia que Olive (Abigail Breslin) foi classificada no concurso "A Pequena Miss Sunshine" na Califórnia. Sai então toda a família: O avô de Olive (Alan Arkin) que ensaia todos os dias a neta para o concurso e que foi expulso de uma casa de repouso pelo uso de drogas; o pai Richard (Greg Kinnear) que vende um programa de auto-ajuda para quem quer ser um vencedor; a mãe típica que valoriza a honestidade; o tio Frank (Steve Carell) , gay que acaba de tentar um suicídio (por isso é recomendado ficar com a família); e o irmão mais velho Dwayne (Paul Dano) obcecado em ser piloto da Força Aérea, faz um "voto de silêncio" até conseguir sê-lo. Todos juntos precisam levar a pequena Olive, sonhadora e desengonçada, com o único meio de locomoção que pode levar toda a família, uma Kombi amarela. Na viagem de três dias entre o Novo México e a Califórnia, eles passam por diversos momentos de alegria, tristeza e descobertas.

Elenco

Abigail Breslin - Olive
Greg Kinnear - Richard
Toni Collette - Sheryl
Alan Arkin - Avô
Steve Carell - Frank
Paul Dano - Dwayne
Bryan Cranston - Stan Grossman
Beth Grant - Official Jenkins
Jill Talley - Cindy

Curiosidades

O filme demorou 5 anos para conclusão por problemas financeiros.[1]
8 milhões de dólares, foi o orçamento do filme.[1]
O roteiro do filme foi comprado por U$250 mil pelos produtores;[1]
Embora o papel do tio suicida tenha sido escrito para o ator Bill Murray, além de pressão do estúdio para que o mesmo ficasse para Robin Williams, o papel ficou com Steve Carell.
O filósofo Marcel Proust é citado durante praticamente todo o filme por Frank (Steve Carell), que é leitor de suas obras e passa toda a história a ensinar a família a aprender com os fracassos, e chega a comparar o estado reinante na família com a própria vida deste filósofo, o que acaba a virar uma lição de moral a ser transmitida pelo filme[2]
Cinco Volkswagen Kombi idênticas foram usadas durante as filmagens.
O filme foi rodado em seqüência.
Steve Carell, ao tempo das filmagens, era um ator relativamente desconhecido em Hollywood. De acordo com um artigo da revista Entertainment Weekly, os produtores do filme estavam preocupados com o fato de Carell não ter a experiência necessária para o papel, além de não ser um ator bem conhecido. Entretanto, entre as filmagens em 2005 e o lançamento do filme em 2006, Carell se tornou um grande sucesso, em decorrência de seu personagem no filme O Virgem de 40 anos. Em razão disto, acabou participando até mesmo da divulgação do filme. Resultado: Carell brilhou na sua atuação do filme e conquistou fama mundial.

Premiações

Vencedor de 2 Prêmios Oscar: Melhor Ator Coadjuvante (Alan Arkin) e Melhor Roteiro Original. Indicado a mais duas estatuetas: Melhor Filme e Melhor Atriz Coadjuvante (Abigail Breslin).
Vencedor de 4 prêmios Indenpendent Spirits Awards 2007, nas categorias : Melhor filme independente, melhor direção, melhor ator coadjuvante(Alan Arkin) e melhor roteiro original.
Recebeu 2 indicações ao Globo de Ouro, nas categorias de Melhor Filme - Comédia/Musical e Melhor Atriz - Comédia/Musical (Toni Collette).
Recebeu 5 indicações ao Independent Spirit Awards, nas categorias de Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Ator Coadjuvante (Alan Arkin e Paul Dano) e Melhor Roteiro de Estréia.
Ganhou 2 prêmios no BAFTA, nas categorias de Melhor Ator Coadjuvante (Alan Arkin) e Melhor Roteiro Original. Foi ainda indicado nas categorias de Melhor Filme, Melhor Diretor e Melhor Atriz Coadjuvante (Toni Collette e Abigail Breslin).



Que vazios instauram as imagens da criança no cinema, especificamente no filme Pequena Miss Sunshine? Talvez possamos nos deixar tomar pelas seqüências da narrativa deste filme, as imagens-tempo e as imagens-movimento, no sentido de deixar-nos ser olhados pelas imagens oferecidas pelo cineasta, pelos atores, pela montagem e permitir que esse ato de entrega possa talvez pensar a potência afirmativa da criança (MARCELLO, 2008) – no caso, a personagem Olive. Ela nos olha, desde a primeira cena do filme, em big close, por meio de uma camada interminável de "lentes": nosso próprio olhar; a projeção na tela do cinema; os enormes óculos da personagem; a tela da TV que ela observa; a ação do controle remoto acionado pela menina, que faz retroceder e repetir imagens; o reflexo da cena do vídeo no vidro dos óculos de Olive; o olhar das misses na cena televisiva, dirigidos às câmeras, e assim por diante.

Penso que em Pequena Miss Sunshine esse olho que vê por nós, que substitui o nosso olho, mas não o descarta (pelo contrário), esse olho, no filme, convida-nos a enxergar mais. A enxergar mais sobre a infância e sua relação com sonhos sonhados antes dela, feitos para ela – como o do concurso de beleza; sobre a sensualidade ensaiada e ao mesmo tempo lúdica e afetiva, a misturar infância e velhice – presente nas aulas de coreografia dadas pelo avô à menina; sobre a relação da criança com as diferentes opções sexuais da sociedade em que vive, que não se separam da proximidade com a morte – o que é evidente nas indagações da menina ao tio suicida e gay, bem como nas recomendações do avô, personagem que morre no meio da travessia, ao neto adolescente, quanto à importância de desfrutar de muitas mulheres, desde cedo, muitas e ao mesmo tempo.

O filme interpõe-se entre nós e o mundo: oferece-nos, por exemplo, a imagem da mulher-mãe que, de alguma forma, cumpre um dos papéis facilmente identificáveis, de apaziguadora, de organizadora do "lar"; mas é essa mesma mulher, a personagem Sheryl, que oferece ao jantar pacotes de alimentos comprados prontos, sem nenhum convencional traço da feminilidade materna esperada; é essa mulher que pontua para os demais o "concreto", a "realidade" – por exemplo, o fato de que seu irmão Frank tentou o suicídio e que é gay. Porém, é essa mesma mulher que assume com a filha de sete anos o sonho do concurso Pequena Miss Sunshine. A complexidade de cada um dos personagens, como Sheryl, produz algo diferente em nós, uma síntese ordenadora do mundo (e, junto, uma ruptura sensível), que generosamente nos confunde e surpreende, que se oferece de fato como uma verdadeira continuidade descontínua. O outro-criança, menina sonhadora e crítica; o outro-homem, intelectual frustrado e homossexual; o outro-mulher, dona de casa; o outro-homem, pai de família e fracassado; o outro-idoso, hedonista e drogado; o outro-adolescente e revoltado, em voto de silêncio – temos aí um exemplo do cinema no papel que Badiou tão bem caracterizou: o cinema como meio de nos apresentar o outro na sua relação com o mundo; mais do que isso, o cinema como modo de amplificar nossas possibilidades de pensar o outro (Badiou, 2004, p. 56). São várias as cenas em que as questões de gênero e sexualidade são apresentadas para além das continuidades esperadas – e é nesse momento que emerge o outro, aquele que é diferente de nós, já que nos é de algum modo estranho, pois assim é exposto. O avô, por exemplo, é amoroso com a neta e, ao mesmo tempo, é o homem que foge ao esperado, que se droga, que faz sexo com várias mulheres simultaneamente, que desafia a instituição do asilo, que aconselha o neto adolescente a não perder a oportunidade de ter relação com mais de uma mulher e assim por diante.

Importa deixar claro que não se trata aqui de analisar representações, mas de compreender que há ali uma realidade efetivamente criada pelo cinema, por um cineasta, pelos diretores, os quais pensam por e com imagens. Daí a importância de nos atermos a imagens efetivamente produzidas – como a cena inicial do filme, o rosto em primeiríssimo plano da pequena Olive, seus enormes óculos e o brilho do olhar depositado sobre a tela da TV e o corpo das misses. Não há dúvidas: o cinema é feito de impurezas, como diz Badiou, a impureza de todas as condições de produção do filme, os atores, o financiamento, as locações, o cenário, a fotografia, o figurino, as câmeras, toda a equipe, o roteiro (Badiou, 2004). Mas há um trabalho de "purificação", de seleção, de eliminações, de escolhas – como a da cena acima descrita, ou a do aconchego de Olive junto ao irmão Dwayne, o ensaio do gesto de tigresa com o avô – cenas que se torna difícil descrever em toda a sua inteireza e em todos os efeitos que produzem em nós.

São imagens que dizem respeito a "algo mais", imagens por vezes indescritíveis, mas que produzem em nós efeitos éticos e estéticos particulares, advindos talvez de uma rara simplicidade alcançada. São imagens que dão a pensar.

(1)Este texto é um fragmento do artigo “Pequena Miss Sunshine: para além de uma subjetividade exterior”, publicado em Pro-Prosições [online]. 2008, vol.19, n.2, pp. 47-57, disponível em http://www.scielo.br/scielo

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